Tintim
03/02/12 22:47 Para quem se diverte com os filmes de Indiana Jones (ou seja, todo mundo, mas eu nem tanto), arrisco a dizer que “Tintim”, a animação de Spielberg, não fica muito atrás.
A ação não para nunca, e apesar de tudo ser só desenho, há tensão real em alguns momentos (como, por exemplo, quando a hélice de um monomotor ameaça cortar o famoso topete do herói).
A época (algum momento em meados de 1930) também aproxima Tintim do mundo de Indiana Jones. Hidro-aviões, países exóticos, bandidos cujo máximo de periculosidade é uma metralhadora: certo internacionalismo pré-globalização, talvez, faz de qualquer viagem uma aventura, e cada país, cada cidade, cada lugar, algo que não é apenas a cópia mal-feita dos shopping-centers da metrópole.
O exotismo, como sabe qualquer leitor das histórias de Hergé, corresponde a uma especial mistura de humor, mistério e banditismo. O malfeitor árabe ou chinês é ao mesmo tempo perigoso e engraçado; o estranho é assim dominável, não sem algum medo.
Verdade que os vilões do filme, baseado em “O Segredo do Licorne”, no caso são ocidentais. E que os personagens mais ridículos –como sempre em Hergé— são “do bem”: os policiais Dupond e Dupont, e a soprano Bianca Castafiore. Faltou o professor Girassol nesse filme –que aliás já anuncia uma continuação em breve.
Fidelidade à história de Hergé não é tudo: uma grande fidelidade visual aos quadrinhos se realizou com maestria nos estúdios de Spielberg.
Ao mesmo tempo, “Tintim” quase não é uma animação. Fora algum nariz mais exagerado, tudo parece quase tão real quanto um filme de verdade. Navios, guindastes, carros, cidades –tem-se a impressão de que nada é de brinquedo.
Com isso, Spielberg segue admiravelmente o espírito de Hergé: as histórias de Tintim são, sem dúvida, fantasiosas, mas não querem nunca passar por pura fantasia.
Os bandidos são “reais”, seus motivos são adultos (há mesmo traficantes de ópio entre os inimigos de Tintim), e dão tiros de verdade. Ao mesmo tempo, o soco de um rapaz franzino é capaz de derrubá-los ao chão.
Essa linha fina entre realismo e fantasia corresponde bem, creio, à idade em que a gente começa a gostar mais dos quadrinhos de Tintim. Penso nos 8, 9, 10 anos. Eu, pelo menos, já não me contentava como o mundo fantástico dos animais falantes ou de Peter Pan, mas também não estava preparado para histórias policiais mais crescidinhas.
É a idade em que o menino já abandonou a maior parte de suas fantasias, exceto a de querer ser adulto antes do tempo.
Precisamente o que a idade indefinida do herói está a representar. Menino, mas não criança, Tintim vive a vida adulta mas ainda não cresceu completamente.
Num filme que não é filme, mas sim animação, ou, se quisermos, numa animação que é quase filme real, Spielberg traduziu, na própria técnica, a delicada ambiguidade cronológica do herói.
Ficou bem bom.
Aguardo ansiosa sua crítica sobre “A Dama de Ferro”. Abs!