Uma paciente de Freud
16/07/12 22:06Tinha tudo para ser um grande livro. A escritora Hilda Doolittle, mais conhecida apenas pelas iniciais H.D., foi uma das principais figuras do movimento imagista na poesia anglo-americana; teve uma grande paixão por Ezra Pound, e alguns de seus poemas têm lugar em qualquer antologia do século 20.
H.D. foi paciente de Sigmund Freud nos anos 1933-1934, e seu relato dessa experiência, com prefácio de Elizabeth Roudinesco, sai agora no Brasil pela editora Zahar. Trechos do seu diário e da correspondência também estão incluídos em “Por Amor a Freud“.
Infelizmente, H. D. não explica nem um pouco por que razão procurou Freud, nem quais eram seus sintomas, nem o que Freud disse para ela, nem o que resultou de toda a terapia.
Fica apenas uma espécie de relato místico-esotérico, em que H.D. se estende sobre as estatuetas egípcias e gregas da coleção de Freud. Entra uma conversa sobre Hermes, Moisés, caduceus, Asclépio, serpentes, como se a poeta merecesse muito mais ser encaminhada a Jung do que a Freud.
Tudo isso se mistura a um tom de adoração reverencial ao “Professor”, de cuja sabedoria e dizeres délficos nunca temos notícia muito exata ao longo do livro.
O prefácio de Roudinesco é bem mais interessante, narrando as atitudes de Freud com relação à homossexualidade, mais tolerantes do que a de seus discípulos na época.
E também mostra o curioso ponto de encontro entre o movimento incipiente de liberação sexual desempenhado por intelectuais ingleses da época –de D.H. Lawrence a Virginia Woolf— e as descobertas de Freud. Um lado era mais “existencialista”, ou “aristocrático” e estetizante, enquanto a psicanálise ia minando a ideologia vitoriana a partir de um ponto de vista mais teórico e científico.
Olá, Marcelo. Há um livro americano, “Unorthodox Freud: the view from the couch”, que faz um apanhado bem interessante de diversos pacientes de Freud (entre eles e elas, a H.D.), com o objetivo de esboçar um retrato de como era o Professor atendendo. Além da reconstrução histórica, os autores realizam uma reflexão pertinente acerca de questões de técnica psicanalítica e sobretudo de como se articulou uma ortodoxia que, a pretexto de salvaguardar a pureza analítica, terminou por desfigurar a coisa toda (aliás, como é comum nos mais diversos campos do saber). Um livro notável, que recomendo com entusiasmo.
Nossa, excelente recomendação! Obrigado.