Peluso condena João Paulo-cont.
29/08/12 15:30João Paulo Cunha conheceu Marcos Valério em 2002, continua Cézar Peluso. É possível que o conhecesse antes, porque a SPM e B já tinha realizado pesquisas eleitorais em Osasco. Diz que MV foi contratado pelo PT para conduzir (DNA propaganda) sua campanha à presidência da Câmara em 2003.
Tive várias reuniões para discutir com MV para discutir a situação política do país, disse JP Cunha.
Teria um político experimentado que discutir com o publicitário “a situação política do país”? Espantoso.
MV não tinha nenhuma intimidade com a secretária de JP Cunha; ela disse que não tinha nenhuma relação com ele. Mas ele presenteou-a com passagens do Rio.
O que estava por trás dessas gentilezas?
O interesse de MV pela licitação na Cãmara me parece evidente.
JP Cunha tinha o comando jurídico e factual dessa licitação. Sò dele podia partir a ordem de abertura dessa licitação. O contrato da Denison Já Estava Prorrogado. Não havia necessidade para nova licitação, logo em seguida à eleição de JP como presidente.
O diretor da Secom, Marcio Marques de Araújo, que exerceria várias funções superpostas na licitação (o que é irregular), oficia em 7 de maio, ao diretor de departamento de material e patrimônio, pedido de licitação. Em agosto, nomeia-se a comissão. Em 4 de setembro, JP recebe os 50 mil. No dia 16, publica-se o edital de concorrência.
João Paulo diz que o pagamento era para pagar pesquisas eleitorais. Inverossimil.
O réu mentiu sobre o recebimento, como diz a comissão de ética da Câmara. E não tinha razões para mentir, se o recebimento fosse lícito.
O dinheiro evidentemente não era do PT, porque o réu sabia que o partido estava insolvente. Não podia esperar nem pedir nada do partido naquela época.
O dinheiro era evidentemente da SMP e B, como emitente e sacadora, o que sabia a mulher de João Paulo, ao assinar o recebimento.
Evidente que o João Paulo sabia desde essa data a origem do dinheiro.
A campanha eleitoral se realizaria em outubro de 2004, quase dois anos depois. Pesquisas seriam inúteis, sobretudo para um partido que não tinha dinheiro.
Aliás, para demonstrar que versões que não correspondem à verdade dificilmente se sustentam, colhi no depoimento de Delúbio uma frase mais compatível com a verdade: JP me procurou em começos de 2004, para realizar pesquisas.
Em janeiro de 2004, eu até acreditaria. Mas em 2003?
Ainda que por hipótese se tratasse de dinheiro do PT, o procedimento clandestino não se justificaria. Mandei ontem saber quantas agencias bancárias há no Congresso Nacional. Só do BB há três. Por que não receber o dinheiro na agência bancária do próprio congresso (e não na agência do Banco Rural num shopping de Brasília) Por que mandar a mulher em vez dos assessores?
Porque ela, como jornalista poderia eventualmente justificar o dinheiro como recebimento de agencia de publicidade?
Não: porque não queria que nenhum dos seus assessores soubesse da entrega do dinheiro, e porque queria total garantia de que o dinheiro lhe seria entrega.
A suposição de que era do PT foi desmentida pelo próprio denunciado: Não tinha conhecimento de que MV estava ajudando o PT com recursos, disse ele.
A defesa tem por pressuposto que o denunciado nada sabia do esquema. É inacreditável a construção da pretensa prova do pagamento da pesquisa. A declaração, prestada em 5 de agosto de 2005, não presta coisa alguma. Não é recibo, porque se fosse, seria dado no ato da entrega do dinheiro. O representante da Datavale, a empresa de pesquisas, não conseguiu explicar uma série de circunstâncias. Não sabia o nome do assessor direito. Não sabe o que fez co m o dinheiro. Diz que “com certeza na minha conta não entrou”. Não podia ter entrado. Basta que nos recordemos que as notas fiscais são três, de prestação de serviços de pesquisa, datadas de 10/9, 30/9. 19/12. A levar a sério essas notas fiscais, a empresa só fez esses três servoiços, porque os números das notas são seguidos. Não fez mais nada em todos esses meses.
É irrelevante, de todo modo, o destino dado a esse dinheiro. O crime é formal. Exige apenas o ato do recebimento, que foi confessado.
Se João Paulo recebeu de MV e não do partido, a que título se deu esse recebimento? A única explicação é que se tratou de vantagem indevida. A SMPeB foi vencedora, embora 2 anos antes tenha sido desclassificada por não preencher requisitos mínimos da concorrência anterior.
A vantagem poderia ser dada mesmo se o ato funcional, omissivo ou permissivo, fosse lícito. Mesmo fazendo tudo certo, João Paulo Cunha seria corrupto, é o caso da “corrupção imprópria”. Cria desprestígio da instituição, ou suspeita sobre sua honorabilidade.
Cito Celso de Mello, meu modelo de magistrado:
Ação penal 307. Constitui elemento indispensável a existência de vínculo entre ato de ofício e vantagem, sendo que o ato de ofício PODE ATÉ NÃO OCORRER.
Não é criação doutrinária de Celso de Mello, está em todo manual. O delito está em por em risco a honorabilidade da função, o que é gravíssimo, porque se tratava de um dos mais altos cargos do Legislativo brasileiro. João Paulo Cunha não podia ter aceito esse dinheiro. Está tipificado o crime de corrupção passiva.