Espiões em toda parte
07/11/12 03:00O primeiro filme de James Bond apareceu há 50 anos, em plena Guerra Fria. Mesmo assim, o mais célebre espião do cinema não poderia pertencer aos quadros da inteligência americana; tinha de ser inglês.
Uma das muitas razões para isso pode ser intuída quando se assiste aos filmes da coleção “Hollywood Contra Hitler”. A caixa reúne seis títulos feitos entre 1939 e 1944, no combate propagandístico do cinema americano em oposição ao regime nazista.
São filmes bastante simplórios e baratos, apesar de contarem com alguns nomes famosos na direção (Fred Zinnemann, Edward Dmytryk, Jules Dassin) e no elenco (Bette Davis, Joan Crawford, Spencer Tracy).
O mais antigo deles, “Confissões de um Espião Nazista”, tem o propósito de apontar a inexistência de um bom serviço de inteligência a serviço dos Estados Unidos.
Os nazistas pintam e bordam em pleno território de Tio Sam; ninguém desconfia de nada, e passar segredos para a Alemanha parece a coisa mais fácil do mundo. Tanto assim que um palerma americano acaba se tornando um valioso informante a serviço de Hitler.
Consegue passaportes americanos em branco, por exemplo, com uma simples ligação de um telefone público. Diz ser o coronel Fulano de Tal, e o órgão emissor de passaportes logo se encarrega de entregá-los no local combinado.
Aliás, se alguns advogados do mensalão tivessem assistido a esse tipo de filmes, talvez pudessem melhorar a linha de defesa que adotaram.
Quando o espião é pego com o envelope, argumenta simplesmente que não sabia qual era o conteúdo. Que estava apenas fazendo um favor para seus amigos, agindo como um portador inocente.
Foi mais ou menos o que declarou Henrique Pizzolato, ex-diretor do Banco do Brasil, para justificar os mais de R$ 300 mil em dinheiro vivo que chegaram, num envelope, às suas mãos.
No filme, quem desvenda a trama nazista é Edward G. Robinson, no papel de um policial do FBI. “Ora, ora”, diz ele ao espião, “o senhor é inteligente demais para criar uma história tão boba como essa de que estava apenas sendo portador de um envelope…”
Mas o espião não era nada inteligente, e o ardil do investigador está em elogiá-lo o tempo todo. Consegue as informações jogando com a vaidade da vítima, e não pela ameaça.
Tudo parece meio difícil de acreditar, mas “Confissões de um Espião Nazista” se baseia numa série de artigos escritos por um ex-agente do FBI, que acabou demitido do posto por ter denunciado a fragilidade dos Estados Unidos diante dos esquemas do Reich.
Quanto aos ingleses, a prática da espionagem estava longe de ser novidade. As peças de Shakespeare fervilham de agentes duplos, e um país que esteve em guerra contra Napoleão certamente encarou Stálin e Hitler como capítulos, sem dúvida mais perigosos, de uma mesma e longa história.
A velha Europa contrasta com a célebre “inocência americana” em outro filme, com roteiro de Dashiell Hammett, baseado em peça de Lillian Hellman. “Horas de Tormenta”, de Herman Shumlin, transporta os conflitos europeus para a mansão de uma aristocrata americana –o tipo da velhota desbocada que ninguém gostaria de ter como sogra, mas que é uma delícia de ver na tela.
Um conde romeno amigo de nazistas está hospedado ali e descobre um ótimo alvo de chantagem quando um dos líderes da resistência alemã a Hitler se refugia na mesma casa.
Os americanos, assinala o filme, até ali nunca tiveram nada a temer. Mas a realidade agora é outra –mesmo o assassinato pode ter justificações morais.
Com toda a discursividade que é inevitável nesse tipo de filme, e apesar dos toques de melodrama familiar em “Horas de Tormenta”, faz bem voltar de vez em quando a esse universo em que o bem e o mal estavam claramente demarcados.
Vocês, americanos, são o povo mais supersticioso do mundo, diz um bandido mexicano no romance “Todos os Belos Cavalos”, de Cormac McCarthy.
Acreditam que o bem e o mal estão dentro das coisas e das pessoas, do mesmo modo que alguém tem cabelo loiro, do mesmo modo que um carro é vermelho.
Para nós, mexicanos, continua o bandido, o mal e o bem simplesmente acontecem; estão em toda parte, à espera de oportunidades.
Se cabe a comparação, agem como espiões, não como fanáticos. Não deixa de ser uma visão útil para quem quiser perder a inocência sem se tornar cínico em função disso.
Marcelo, gosto muito de você e do que escreve. Não duvide disso, ficaria muito triste. Sou apenas uma “megerinha não domada” (brincadeira)… sou um anjo… Sou compulsiva obsessiva em certas ocasiões… só isso… é só uma questão de limites. Fique em paz.
“Até nunca mais é muito radical”. Não é coisa que “amigos” digam, é coisa de “mulheres alteradas”. Que grosseria a minha! Mil desculpas! De qualquer modo, estou uma chata de galochas e meus comentários já estão virando uma “soap opera”. As palavras são sinceras, mas os atos precisam de moderação. Voltando ao tópico, a espionagem precisa ser mais secreta e a tentativa de amizade mais silenciosa.
Prezado Marcelo,
Já ultrapassei o limite da chatice.
Prometo, a partir de agora, leituras mensais, semestrais, e verdadeiramente silenciosas. Adeus e até nunca mais. Fique em paz!
Correção:
Ponto 4. “use o mesmo”, “use o codinome”.
A tentativa de correção de uma frase ambígua, nesta postagem, talvez resulte num grande mal-entendido. Sinto muito mesmo por isso. Entre tantas possíveis maledicências, há quem possa interpretar de uma maneira freudiana, absoluta… Mas não é o caso. Está longe de ser.
1. Gostei muito do texto agora que li pela segunda vez, com mais calma.
2. Fiz aquela referência aos elogios, mas gostaria de esclarecer que, se você fosse um personagem, jamais seria “o espião não inteligente” (que lástima um espião desse tipo!).
3. Eu até que poderia ser “uma velhota desbocada dizendo absurdos na tela”… Falando nisso…
4. Será que o “sr. amedar” anda me espionando? Coincidentemente acordei cedo, e ainda tive a ideia de vir fazer mais um acréscimo aos meus comentários… mas reconfirmo que não tenho nada a ver com qualquer outro comentário que não esteja sob o codinome de Gabrielle Émilie. E, do jeito que as coisas andam, espero que ninguém mais o use tentando se passar por mim.
5. Mais uma questão “filosófica” ou “existencial” (não de boteco ou bar, mas de cozinha, isto é, doméstica)… Sinto estranhamento e desconforto diante do cinismo. Acho que não leva a nada. Aceito e valido o ceticismo, que a meu ver é necessário e mais elegante.
6. Não quero mais incomodá-lo com os meus comentários. Vou fazer um esforço sincero para apenas ler. Será que vou conseguir? Sou do tipo leitora-intérprete grudenta.
I do believe all the ideas you have presented to your post. They’re very convincing and can definitely work. Nonetheless, the posts are very short for novices. May you please prolong them a little from subsequent time? Thank you for the post.
Questão “filosófica”: Há quem use elogios como ardis, por uma razão ou por outra… mas os elogios podem ser apenas uma manifestação do sentimento particular de alguém por outrem. Ao receptor do elogio cabe o “cuidado” do que fazer com o mesmo. Mais uma brincadeira: E Voltaire, onde está? Mas que não apareça muito zombeteiro com seus alvos…
Vou deixar minha interpretação do texto em suspenso, mas gostaria de avisar que os elogios que lhe faço são bem sinceros. Com o perdão da brincadeira, gosto de espionar este blog. E espero que meus comentários não incomodem… bjs de uma amiga/admiradora virtual.