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Marcelo Coelho

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Keep calm and carry on

Por Folha
27/03/13 03:00

A moda pegou, com mais de 70 anos de atraso. Camisetas, mensagens no Facebook, capas de caderno, não há lugar onde não esteja reproduzido o velho cartaz britânico: “Keep calm and carry on”.

Ou seja, “fique calmo e vá em frente”. O slogan, pelo que vejo na Wikipédia, foi criado pelo governo inglês em 1939, para ser divulgado na eventualidade de uma invasão nazista. A versão clássica traz a coroa do império encimando as palavras, que se destacam sobre o fundo da bandeira do Reino Unido.

O cartaz não foi muito usado na época, e ficou nos arquivos governamentais. Uma rara cópia foi encontrada num sebo em 2000, e só nos últimos anos a frase virou febre. O mais comum é encontrá-la com letras brancas, sobre um fundo monocromático.

A graça da coisa está em modificar o slogan para todo tipo de situações. “Keep calm e faça um boletim de ocorrência.” “Keep calm and call Batman.” “Keep calm e aguarde o feriadão.” “Keep calm e coma chocolate.” A lista é infinita.

Existem também as modalidades inversas, que começam com “Get excited”, e com “Freak out”: “Dê a louca e quebre tudo”, por exemplo.

Manter a calma eu acho melhor. Qualquer pessoa pode apreciar a sugestão, mas não é casual que a moda tenha começado na Inglaterra.

Teoricamente, o slogan deveria servir como incentivo à resistência. Poderia ter sido utilizado durante o bombardeio alemão sobre a Inglaterra, num momento em que o país estava sozinho contra Hitler.

Talvez não tenha sido sequer necessário difundir os tais cartazes. Enquanto choviam sobre Londres as bombas da blitz, a pianista Myra Hess apresentava, imperturbável, seus recitais de Beethoven; há um filme em que ela aparece, com um bombeiro ao seu lado para qualquer emergência.

Teríamos aí um bom motivo para a frase entrar na moda. Manter as mesmas atividades, num clima de ameaça, equivale a dar um sentido novo, e mais alto, à própria rotina.

O slogan traz também o sabor nostálgico de uma época em que governo e população poderiam, por vezes, parecer uma coisa só. As bombas caem sobre todos.

A liderança de Churchill naqueles anos de guerra —que também volta a ser reverenciada atualmente— colocava em cena algumas funções do Estado democrático que, talvez, estejam em desuso.

Coordenação, organização, motivação, por exemplo. Uma coisa são as reações individuais que possamos ter diante de um problema; outra, a atitude que sabemos ser melhor adotar coletivamente. Uma terceira coisa é um governo que, ouvida a vontade da maioria, torna-se legítimo ao apontar o rumo a ser seguido.

Depois de décadas de individualismo e desregulamentação, entretanto, o “keep calm and carry on”, parece adquirir o sentido oposto. Em primeiro lugar, imagino que a força da crise econômica europeia tenha tido seu peso na ressurreição do cartaz.

Mantenha-se calmo, aguente, que um dia passa. A frase naturalmente se aplica a tudo o que não tem solução, ou cuja solução está entregue a um governo fraco, incompetente e corrupto: o trânsito nas cidades brasileiras, a criminalidade, o desemprego, os aeroportos, tudo o que quisermos.

Ao mesmo tempo, o slogan foi “privatizado”, por assim dizer. Torna-se um convite ao conforto (fique calmo e coma chocolate), ao aperfeiçoamento pessoal (keep calm and play volleyball), ao consumo (fique calmo e use jeans da nossa marca).

As adaptações deixam de lado a segunda parte da frase —“carry on”, “siga em frente”. Seguir em frente não é tão fácil. Embora não tenha tanto destaque, essa recomendação me parece a mais significativa para o momento atual.

Trata-se do slogan de todo zumbi. Como se sabe, esses monstros também voltaram à moda. Depois dos filmes de vampiro, no estilo de Anne Rice, dos filmes de catástrofe e dos filmes de história em quadrinho, recorre-se ao velho depósito do terror “trash” para manter em movimento a indústria cinematográfica.

Vem aí uma superprodução de zumbis com Brad Pitt. Na época em que o capitalismo financeiro era mais charmoso, Brad Pitt era um dos belos atores de “Entrevista com o Vampiro”. Os zumbis são um pouco como essas instituições financeiras que quebraram em 2008 mas seguem vivas até agora, arrastando seus pedaços e “seguindo em frente”.

Pedem calma, naturalmente, ao distinto público.

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Comentários

  1. Infupettefron comentou em 05/04/13 at 4:02

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  3. Gabrielle comentou em 30/03/13 at 19:21

    Adorei esta parte do texto:

    Teoricamente, o slogan deveria servir como incentivo à resistência. Poderia ter sido utilizado durante o bombardeio alemão sobre a Inglaterra, num momento em que o país estava sozinho contra Hitler.

    Talvez não tenha sido sequer necessário difundir os tais cartazes. Enquanto choviam sobre Londres as bombas da blitz, a pianista Myra Hess apresentava, imperturbável, seus recitais de Beethoven; há um filme em que ela aparece, com um bombeiro ao seu lado para qualquer emergência.

    Teríamos aí um bom motivo para a frase entrar na moda. Manter as mesmas atividades, num clima de ameaça, equivale a dar um sentido novo, e mais alto, à própria rotina.

    • Gabrielle comentou em 30/03/13 at 20:07

      Adorei, realmente, este trecho. Não importa o que esteja “zumbindo”, continue a sua vida ou o seu trabalho visando algo mais elevado. Não deixe que o zumbido interfira no seu trabalho ou na sua vida. Comento abaixo a última parte do texto, sobre os filmes trash…trash, lixo… então, divaguei…

  4. Gabrielle comentou em 30/03/13 at 19:14

    Uma breve reflexão sobre o lixo:

    E o que há de errado com o lixo, pobre lixoɁ Não vejo nada de errado. Aliás, sob uma interpretação leiga e “selvagem” que me ocorreu agora… O que é o lixo senão parte daquilo que foi usado por nós e descartadoɁ

    Então, se é lixo, foi usado ou parte sua foi usada. Talvez seja um sintoma saudável, por parte de alguém, não relacionar pessoas com lixo. Sinal ou prova de que não as usa. Ou sinal de que não as inferioriza.

    De modo geral, relaciona-se produtos ou objetos com o lixo. Em relação a esses, são denominados lixo aqueles mal acabados, mal feitos, facilmente descartáveis. Ou, tornam-se lixo os consumidos.

    Lixo é resíduo, é parte de algo, orgânico ou inorgânico, fabricado, industrializado. O lixo vem de nós mesmos, seja por um processo orgânico ou por um processo de consumo, portanto, não há por que não lidar com ele. Ao contrário, temos de lidar com ele.

    Quanto aos produtos culturais, melhor não fazê-los mal acabados, quando se sabe fazê-los melhor. Por outro lado, faz parte de qualquer trabalho a tentativa e o erro, e, assim, os trabalhos mal acabados também têm sua existência justificada.

    Quanto aos “carry on” dos zumbis, dos mortos vivos, também acho muito saudável… sinal de que a vida está falando mais forte…

  5. Irene comentou em 28/03/13 at 10:58

    Sem esquecer do célebre “zumbinzaço” erguido por Mickael Jackson e seu bailado maravilhoso em Thriller! Adorei seu texto. como sempre muito bom!

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