Livros: Rubem Braga em Paris
14/05/13 16:19Tinha tudo para dar certo: o maior cronista brasileiro, Rubem Braga, escrevendo perfis de personalidades como Picasso, Cocteau, Sartre e Duke Ellington. Escritos entre 1950 e 1952, para o “Correio da Manhã” e para a “Folha da Tarde”, estes “Retratos Parisienses” constituem apesar disso uma decepção.
Pesa em quase todas as páginas a melancolia, ou melhor, o desinteresse melancólico do autor. A mesma característica de personalidade que fazia Rubem Braga tirar maravilhas de um evento sem importância acaba operando, aqui, uma mágica em sentido oposto. As personalidades mais interesses da época aparecem reduzidas a sua dimensão mais corriqueira e banal.
“Picasso evita indagar minha opinião política: não tenho interesse em dizer-lhe e também não quero fazê-lo falar sobre política. Na verdade, estou fazendo uma visita à toa, e não quero nada (…) Há brinquedos de criança pelo chão, e na paisagem do morro há pinheiros, palmeiras, hortas e pomares, cactos no jardim do lado da casa, um tufo de hortênsias floridas do outro lado, uma cigarra que canta em algum canto, uma galinha que cacareja em algum quintal perto.”
As opiniões políticas de Picasso eram totalmente previsíveis naquela época, em que ele desenhava pombas para a campanha soviética “em prol da paz”. Mesmo assim, Rubem Braga sempre há de preferir ouvir as cigarras do que Picasso. Afasta-se do pintor para ficar brincando com a filha pequena, “Colomba”. Não será Paloma?
Falta cuidado nas notas e na revisão, que deixa passar, por exemplo, a seguinte pergunta de Rubem Braga (a respeito de uma exposição de Frans Post): “Por que nos comove tanto esse pedaço da rue Vermeer?”
A menos que exista alguma “rue Vermeer” em Paris, ele se refere a um pedaço de rua num quadro de Vermeer.
Rubem Braga se interessa mais por Sartre, em cuja aparência atarracada identifica mais o camponês alsaciano do que o filósofo então na moda. A aparência de Juliette Gréco naturalmente o deixa mais animado –mas é bem simpático ver de que modo Braga destacou as qualidades e os interesses intelectuais da bela cantora existencialista.
Talvez, no caso de Picasso, Braque, Cocteau, a culpa não seja apenas do desinteresse do cronista; eles já haviam se transformado em monstros sagrados, longe do debate estético mais encarniçado daqueles anos. Nesse sentido, é notável o encontro de Rubem Braga com André Breton, dirigindo ainda, trinta anos depois da “revolução surrealista”, um grupo de seguidores que o jornalista compara, com tristeza, aos maçons e aos positivistas que sobreviviam no Rio de meados do século 20.
Também o tédio parece surgir como reação à condescendência com que Braga julga estar sendo recebido. Um jornalista brasileiro? Ah sim, como não. Amigo de Cícero Dias. Certo, sente-se. O Brasil é muito interessante. Em silêncio, Braga parece responder: “e você não.”
Marcelo, por coincidência acabo de ler este livrinho. Numa única palavra: brochante.