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Marcelo Coelho

Cultura e crítica

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A fala do teaaatro

Por Marcelo Coelho
24/10/13 14:48

Reclamei (ver post anterior) da fala exagerAAAda dos aTOOOres na montagem de “Nossa Cidade”. Naturalmente, é comum sentirmos esse tipo de estranheza quando estamos no teatro. Lembro-me de uma “Fedra”, com Fernanda Montenegro, em que essa grande atriz não apenas fazia um bló-bló-bló afinal adequado ao texto clássico, mas em que repetia, a cada frase, a mesma “melodia” vocal, gerando uma sensação de pobreza de meios quase insuportável.

No caso de “Nossa Cidade”, além do hábito da empostação teatral apareceu também o desejo do diretor de tornar tudo mais estereotipado –afinal, tratava-se de americanos cretinos comuns— e também a intenção de “estilizar”, de dar uma aura de irrealidade e distância às cenas do cotidiano. De modo que ao primeiro exagero se somam dois outros.

Jorge Luís Borges disse certa vez, nas suas conversas com Bioy Casares, que numa obra de arte sempre é possível encontrar justificativas plausíveis para um defeito evidente. Digo “defeito”, no caso, como equivalente de algo que atinja o nosso gosto, as nossas preferências.

Em todo caso, faz parte da arte do diretor e do ator a capacidade de, dado um “parti pris”, uma escolha estilística, trabalhar ao máximo as nuances, acrescentar novos sentidos dentro da “gramática”, da coerência que se quis impor ao espetáculo. Quando não se faz isso, tudo se torna mecânico e pobre.
No blog da Companhia das Letras, há um texto interessante sobre a “falsa oralidade”, escrito pela editora Vanessa Ferrari. Cito alguns trechos.
Chamo de falsa oralidade quando alguém diz alguma coisa de um modo que foge ao registro natural da fala. E normalmente isso acontece porque a pessoa incorpora na fala uma regra que pertence à língua escrita, sem atentar para os problemas que essa transposição ipsis litteris pode causar. Um exemplo bastante comum da falsa oralidade são os desenhos infantis.
As crianças, como se sabe, são uma graça. Pelo menos uma parte do tempo. Elas reproduzem tudo tal qual ouvem e veem, sem ironias ou despistes, e são inúmeros os exemplos de como elas podem ser originais com o uso da língua, uma vez que ainda não foram enquadradas pelo manual da correção e do bom-tom. Mas essa originalidade, reconhecida e celebrada aos quatro ventos, implode quando elas imitam um personagem de desenho animado. Nessa hora, fingindo-se de super-herói, elas reproduzem essa falsa oralidade a que estou me referindo. Por exemplo, assim: “Vamos, sigam-me, amigos. A pedra filosofal está em minhas mãos e eu nunca mais deixarei que ela escape”. Sigam-me, amigos? Deixarei?

Ah, mas aí eu discordo. Acho ótimo que as crianças desde cedo usem esse tipo de vocabulário. Os desenhos animados são na verdade uma das melhores introduções ao mundo da linguagem escrita; sem contar que, entrando nesse mundo, estabelece-se a diferença entre realidade e ficção.

Outra coisa, claro, é fazer de “Nossa Cidade” um espetáculo dublado pela empresa Álamo.
Em todo caso, Vanessa Ferrari está certa quando diz que
No teatro, ao vivo, a falsa oralidade fica ainda mais gritante. Porque ninguém — absolutamente ninguém — fala sem achatar, comer, subtrair, trocar, incluir na palavra uma letra aqui, outra ali.
Nesse sentido, é justificável que se fale de maneira diferente no teatro. Só que,
Somada à ideia de apagar esses resquícios de “imperfeição” nos diálogos — que já foram construídos de forma pouco natural —, há um tipo de interpretação baseada no exagero que acentua muito essa impressão da falsa oralidade. Não é preciso arregalar os olhos para demonstrar temor. Tampouco fazer caretas nos momentos de insegurança. Quem chora tenta esconder a lágrima, não o contrário. Na maioria das vezes, o riso emite um som moderado, muitas vezes som nenhum. A risada desbragada é uma exceção. Medo e constrangimento raramente se traduzem por uma gagueira momentânea. E como é difícil gaguejar de mentira! O que fazemos o tempo todo é disfarçar as angústias e inseguranças. Mas boa parte da atuação cênica privilegia o escancaramento delas, numa espécie de caricatura de nós mesmos, embora, no fundo, não pareça ser essa a intenção. E se isso se repete com tanta frequência é possível que não seja só uma questão de direção, roteiro ou atuação, mas de algo tão arraigado que parece ser imutável.
Justificativas: bem, ninguém está obrigado a ser perfeitamente natural e realista numa montagem de teatro. Mas também é chato quando, para não ser “natural”, o ator acaba fazendo de seu personagem um pateta.

About Marcelo Coelho

Marcelo Coelho nasceu em São Paulo, em 1959. Estudou Ciências Sociais na USP. Escreve semanalmente no caderno "Ilustrada", da Folha de S. Paulo, e publicou, entre outros, "Crítica Cultural: Teoria e Prática" (Publifolha) e "Patópolis" (Iluminuras)
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Comentários

  1. mauricio paroni comentou em 24/10/13 at 23:02

    a velha questao. discutida aqui: http://www.spescoladeteatro.org.br/secoes-sp/ver-papo-com-paroni.php?id=3272

    mas no brasil isso é de verdade insuportavel. tanto é que as pessoas ssas nao suportam esse tipode teatro. 90 por cento do teatro por aqui… parabéns.

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