Uma agenda para a crise
22/06/13 12:57artigo que publiquei hoje no caderno “Cotidiano” da Folha.
Uma agenda para a crise
Não acho que jornalista deva dar conselho a ninguém, mas me preocupa a profundidade da crise. Acho que a presidente Dilma acertou, no geral, quanto ao tom e ao conteúdo do seu discurso ontem. Mas talvez as respostas tenham de ser mais profundas.
Por mais que sejam variados os lemas e palavras de ordem dos manifestantes, o fato básico é que eles não se veem representados nem atendidos pelo Congresso, pelas prefeituras, pelos governadores e pelo Executivo Federal.
Acho que há espaço para uma série de iniciativas capazes de recuperar –e sanear—as instituições políticas, antes que o descrédito seja completo e a única resposta possível seja o aumento da repressão.
Cito algumas, só como exemplo, porque o conteúdo específico de cada item poderia ser discutido conforme o gosto do governante.
1- Um esforço pela austeridade pessoal. O presidente uruguaio, Pepe Mujica, não usa carro oficial, não mora em palácio e se veste como um jeca. Era tempo de todos os políticos brasileiros seguirem o seu exemplo.
2- A retomada, no nível federal, da faxina dos ministérios intentada inicialmente pela presidente Dilma. As forças políticas mais sérias do país estão reféns de uma “base parlamentar” que pode ser útil no dia-a-dia, mas é o principal empecilho para a resolução da crise.
3- Uma iniciativa mais concreta de reforma política. Nem sei se o financiamento público de campanhas é o melhor método. Mas é preciso responder à desmoralização de um sistema em que os representantes eleitos pelos cidadãos se tornam, na verdade, representantes das empresas que contribuíram para seu caixa de campanha.
4- Na questão da educação, bem atendida pela proposta presidencial de dedicar 100% dos royalties de petróleo a essa área, acho que nada se fará sem um aumento radical do salário de professores. Mesmo com o aumento de impostos que teria de haver.
5- Uma real abertura para os movimentos populares. Por que os prefeitos não convidam alguém próximo do Movimento Passe Livre para a Secretaria dos Transportes? Em nome de que lógica partidária, interna ou externa, esses cargos são loteados?
6- Não é que os manifestantes não sabem o que querem. Querem coisas demais. Faço o raciocínio: se há propostas de reforma em todas as direções, e se o sistema político está em descrédito, seria necessário dar vazão e forma institucional ao debate que está nas ruas, se ele não refluir. Seria o caso, a meu ver, de convocar uma Assembleia Nacional Constituinte, com fins específicos (reforma política, reforma previdenciária, etc.), para a qual poderiam candidatar-se cidadãos mesmo sem filiação partidária.
O fundamental é encontrar, para a vontade de mudança, um caminho político. Caso contrário, ou teremos paralisia ou as formas mais despolitizadas e selvagens de protesto.