A Igreja pode tudo!
30/04/13 17:13No debate de que participei em Curitiba (ver post abaixo), insisti na ideia de que Bento 16, ao mesmo tempo em que foi muito humano e inteligente ao tratar das dúvidas que podem passar pela cabeça de todo mundo, ateu ou não, foi também excessivamente conservador em questões sexuais.
Não é obrigatório que um papa seja assim. Um papa pode tratar de milhares de assuntos. Pode esquecer-se de outros. Não se faz campanha contra o divórcio com a mesma intensidade, hoje em dia, da campanha contra a camisinha.
Papas mudaram a doutrina da Igreja ao longo do tempo. Antes, a própria forma do governo republicano era considerada errada pelo Vaticano.
Recentemente, debati o assunto com um professor da PUC, que afirmou o seguinte. Há coisas que podem ser mudadas, porque não fazem parte do que a Igreja considera “verdades reveladas”. O casamento dos padres, por exemplo, vigorou durante séculos. Outras coisas, como a condenação ao aborto, não mudarão nunca, porque pertencem à ordem da revelação divina.
Perguntei ao teólogo onde encontrar as verdades reveladas. Na Bíblia? Só no Novo Testamento? Se nos fixássemos em tudo o que a Bíblia diz, não seria fundamentalismo? De fato, respondeu o teólogo, a Revelação não é só o que está escrito na Bíblia. As interpretações, os escritos dos papas etc., podem também ser incluídos.
Tudo depende, portanto, do que se considera “revelação”. Nesse ponto, Francisco Catão disse coisas muito interessantes no encontro que tive em Curitiba. O texto escrito da Bíblia é palavra “congelada”, fixa, disse ele. E a palavra de Cristo é viva.
Catão citou um documento, segundo ele pouco estudado, no qual se listam (e o texto bíblico vem em último lugar) as fontes da revelação.
Em primeiro lugar, antes de qualquer dogma ou pensamento teológico, existe uma revelação especial: o próprio Jesus. É em Jesus que se revela a palavra divina. O resto –evangelhos inclusive—são manifestações, reflexos, dessa revelação real e carnal.
O que concluir disto?
Que “a Igreja pode tudo!!” Foi o que exclamou Francisco Catão. Mais não quis dizer. Mas entendia-se o sentido de sua mensagem.
Acima das considerações culturais e históricas, que por exemplo abominam (ou não) a tortura e a pena de morte, o divórcio ou o casamento gay, existe a mensagem viva de Cristo. O que Cristo diria, hoje, na cultura atual, a um casal gay? Amem-se? Ou nunca mais se vejam e penitenciem-se? Teríamos um Cristo militando contra o amor, porque é entre pessoas do mesmo sexo?
Conclusões minhas, não do teólogo Catão. Ele disse apenas “a Igreja pode tudo”. E acrescentou comum latinzinho. “Intelligenti pauca”. Poucas palavras bastam a quem ouve com inteligência.
A questão é, naturalmente, saber quem tem “poder” para dizer o que Cristo faria hoje, na cultura atual. Não estaríamos tornando arbitrário demais o julgamento da Igreja? Bem ou mal, o que prevalece hoje em dia é uma “jurisprudência” teológica acumulada. Para usar termos weberianos, é uma burocracia altamente racionalizada, sem carisma. O resultado é que os tempos avançam e o papa continua correndo atrás do prejuízo.